Arnaldo Rabelo

27 julho 2006

Como vender para os ricos

O que as empresas que exploram o mercado de luxo fazem para seduzir consumidores para lá de exigentes

Vender para clientes com talão de cheques sem limites requer cuidados especiais. Relacionamento é a palavra-chave. Reservados, os membros da elite endinheirada apreciam gestos de reconhecimento e exclusividade, como receber convite para um jantar especial ou para uma festa imperdível. A modalidade de evento depende da faixa etária do público visado. No mês passado, a mesma Moët Hennessy reuniu 350 jovens solteiros e de alto poder aquisitivo no badalado dining club Museum, em São Paulo. O pretexto era a celebração antecipada do Dia dos Namorados. O objetivo real: apresentar e reforçar a imagem da Moët Brut míni, outro rótulo da maison francesa.

Por trás de tanta badalação, há um mercado para lá de volumoso. É o mercado do luxo. Suas vendas crescem à razão de 35% anuais e movimentam estimados 2,5 bilhões de dólares no Brasil. Estudo da consultoria Capgemini dá conta da existência de 98 000 super-ricos no país, com patrimônio superior a 1 milhão de dólares. Outros 250 000 possuem a metade disso. Sem contar que muitos itens de luxo são acessíveis à classe média alta. Atentas a esse público, as empresas valem-se de um arsenal de marketing que vai muito além da propaganda convencional. Estar familiarizado com os hábitos de consumo e estilo de vida dos ricos é apenas parte da tarefa. O marketing deve ser temperado por uma verdadeira obsessão por detalhes, para encantar e surpreender. Um exemplo dessa capacidade de causar surpresa foi a promoção, realizada no ano passado, pela joalheria Tiffany, estabelecida na Quinta Avenida, em Nova York, em conjunto com a Robb Report, publicação tida como a bíblia do consumo de luxo. Ao comprador de um diamante de 25 quilates, avaliado em 1 milhão de dólares, foi oferecida uma viagem à mina de onde a pedra foi extraída, na África do Sul. No retorno a Nova York, o cliente pôde acompanhar o processo de lapidação e ainda palpitar sobre o estilo da jóia criada sob medida.

Recorrer à originalidade para seduzir consumidores para lá de exigentes faz parte das preocupações até de fabricantes que têm na tecnologia seu maior trunfo. No caso do mercado de jatos executivos, ter um produto tecnicamente avançado deixou de ser garantia de sucesso. "É claro que, para atrair a atenção do comprador de altíssimo luxo, é preciso oferecer qualidade inquestionável", afirma Luiz Carlos Affonso, vice-presidente da Embraer. "Mas hoje é preciso ir além." A Embraer encomendou à montadora alemã BMW todo o projeto de interior das aeronaves. Além disso, a companhia, interessada em ampliar sua fatia no mercado de aviação executiva, passou a patrocinar eventos destinados à elite, como campeonatos de hipismo. No ano passado, o cavaleiro Rodrigo Pessoa participou de uma prova nos Estados Unidos usando as cores da Embraer -- que aproveitou a ocasião para exibir duas maquetes em tamanho real de seus novos jatos.

Em outros ramos -- como o de automóveis --, a fidelidade à marca joga um papel decisivo como trunfo para o vendedor. Pesquisas revelam que esse índice atinge 60% entre os que optam por uma Ferrari e tendem a repetir a compra. "Mentalidade de colecionador", foi como Gian Luigi Buitoni, ex-presidente da Ferrari nos Estados Unidos e autor de "Vendendo Sonhos", batizou esse comportamento, que também se estende a canetas, relógios e jóias. Mesmo contando com a vantagem de uma marca forte, empresas como a Ferrari não descuidam do relacionamento para impulsionar as vendas. A Via Europa, importadora exclusiva da marca no Brasil, mantém um qualificado banco de dados com nomes de clientes e potenciais compradores por eles indicados. De tempos em tempos, eles são convidados a pilotar os modelos esportivos na pista de Interlagos, em São Paulo. Em sua recente visita ao Brasil, Luca di Montezemolo, presidente mundial da Fiat, a dona da Ferrari, recebeu pessoalmente os clientes brasileiros. A Via Europa chega a investir 20% do faturamento em programação de eventos únicos, que resultam na venda de cerca de 30 unidades a cada ano.

As imobiliárias estão entre as empresas brasileiras que mais se esforçam para receber o público de elite de maneira diferenciada. De olho em fortunas recentes forjadas no mercado financeiro, várias delas conceberam novas estratégias para receber esses clientes especiais. Os empreendedores do Parque Cidade Jardim, um dos mais sofisticados lançamentos paulistanos, chegaram ao mercado em maio com uma badalada festa, com direito a show de Caetano Veloso, no monumental estande de vendas, erguido com pé-direito duplo e piso revestido com mármore travertino. O cliente recebe um atendimento ultravip por corretores treinados por especialistas em comportamento. O estande possui um apartamento-modelo de 400 metros quadrados de área útil, totalmente decorado. "Preparamos um verdadeiro cenário do que será uma unidade pronta", afirma Álvaro Coelho da Fonseca, presidente da Coelho da Fonseca, empresa responsável pela comercialização do empreendimento. Cada negócio fechado é celebrado com um brinde no bar operado pelo restaurante Fasano. Tudo com muito glamour -- condição indispensável para vender para os ricos.

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